Abstract
Este artigo tem como objetivo questionar, a partir de evidências etnográficas, a aplicação de um dispositivo jurídico chamado “Justiça Terapêutica” no contexto dos grupos de Narcóticos Anônimos (NA). No Brasil a lei não mais permite o encarceramento do usuário de psicoativos ilícitos, mas o sistema judiciário ainda pode puni-lo através de penas alternativas, como o tratamento compulsório em grupos de NA. Esta medida punitiva borra a distinção entre “uso” e “dependência” de substâncias psicoativas, uma vez que nem todos os transgressores são necessariamente “dependentes”. Narcóticos Anônimos, por princípio, é um grupo de ajuda mútua formado por pessoas cujo principal objetivo é controlar ou abandonar o uso de substâncias psicoativas após um período de acúmulo de danos à saúde e/ou à vida social. A terapia é basicamente simbólica. Mais do que isso, sua eficácia está diretamente associada com o engajamento subjetivo do indivíduo neste propósito. Desta forma, a principal questão que guia o desenvolvimento deste artigo é: qual o propósito de enviar aos Narcóticos Anônimos indivíduos que não estão necessariamente engajados em um processo de doença/terapia, mas em um de transgressão/punição.